13º Capítulo

Responsabilidade penal



Em direito penal, crime, sob o aspecto analítico, é toda ação ou omissão típica, antijurídica e culpável (finalismo tripartido, causalismo). Ou, ao menos, todo comportamento típico e ilícito (finalismo bipartido). Os penalistas modernos entendem que o conceito analítico de crime envolve toda conduta típica, antijurídica e ameaçada por pena (teoria constitucionalista do delito).

Esquematicamente:





A responsabilidade penal corresponde ao dever jurídico de responder pela ação delituosa que recai sobre o agente imputável.

Entende-se que a culpa penal consiste na censurabilidade da conduta ilícita (típica e antijurídica) daquele que tem a capacidade profana de entender o caráter ilícito do fato (consciência potencial da ilicitude) e de se determinar de maneira ajustada ao direito (exigibilidade de conduta conforme ao direito).

13.1 Imputabilidade

Imputabilidade é capacidade de culpa, compreendendo-se em pressuposto e não elemento da culpabilidade.

Da leitura do atual Código Penal brasileiro (arts. 26 e s.), extrai-se que a imputabilidade é a capacidade de entender e de querer, isto é, do entendimento da ilicitude de sua conduta e de seu autodomínio, que tem o maior de 18 anos.

O professor Heleno Cláudio Fragoso1 preleciona que “a imputabilidade é a condição pessoal de maturidade e sanidade mental que confere ao agente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar segundo esse entendimento”.

13.2 Inimputabilidade e semi-imputabilidade

Sabe-se que a imputabilidade é a capacidade de culpabilidade. No entanto, em razão de doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou retardado, a higidez biopsiquíca do agente pode restar comprometida.

Assim, a inimputabilidade ou incapacidade de culpabilidade pode decorrer da norma, ao se presumir o desenvolvimento incompleto dos menores de 18 anos, bem como nos casos de ausência de sanidade mental. O menor de 18 anos, por força do art. 228 da CF, é tido por penalmente irresponsável, ou seja, é inimputável. Idêntica disposição se verifica no art. 27 do CP.

Razões de política criminal influenciaram o legislador a adotar a menoridade como fator de inimputabilidade absoluta.

Além da menoridade, o Código Penal consagra outras três causas biológicas que podem conduzir o agente à inimputabilidade, quais sejam, doença mental, desenvolvimento mental incompleto e desenvolvimento mental retardado.

Há certas condições psíquicas, de que são exemplos algumas neuroses, transtornos obsessivo-compulsivos, em que o sujeito, apesar de saber o valor de seu comportamento, não detém a capacidade de autodeterminação ou de autogo­verno para refrear seu agir, daí ser considerado, para o direito penal, um doente mental, de forma a ser rotulado de absolutamente incapaz.

Essa falta de capacidade decorre de doença mental ou do desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

O eminente Cezar Roberto Bitencourt (2008) ensina que se devem entender por doença mental as psicoses, os estados de alienação mental por desintegração da personalidade, a evolução deformada de seus componentes (esquizofrenia, psicose maníaco-depressiva, paranoia) e assim por diante, incluindo também o hipnotismo (falta de consciência e vontade).

Já o desenvolvimento mental incompleto é aquele que não se concluiu, alcançando, além dos menores, os surdos-mudos e os silvícolas (índios) não adaptados. Nesse caso, a psicopatologia forense verificará, no caso concreto, se a anormalidade produz a referida incapacidade (cf. n. 5, infra).

Por desenvolvimento mental retardado compreende-se a oligofrenia em todas as formas tradicionais: idiotia, imbecilidade e debilidade mental.

Todos esses estados de enfermidade mental carecem de exame médico-legal para comprovar a gravidade que ostentam, podendo este ser realizado tanto na fase do inquérito policial como no processo penal, mediante a instauração de incidente de insanidade mental do acusado (arts. 149 a 154 do CPP).

Uma vez determinada a inimputabilidade do agente, sua absolvição se impõe (art. 26 do CP), aplicando-se, no entanto, medida de segurança (absolvição imprópria – arts. 96 a 99 do CP).

Existe uma situação anômala que se situa entre a imputabilidade e a inimputabilidade, em que, à vista de certas gradações, pode haver uma influência decisiva na capacidade de entendimento e autogoverno do indivíduo. Trata-se da semi-imputabilidade.

Aqui se situam os denominados fronteiriços (limítrofes), os quais apresentam situações atenuadas ou residuais de psicoses, de oligofrenias ou ainda quadro de psicopatias. Tais estados ou situações afetam a higidez mental do indivíduo, sem, contudo, privá-lo completamente dela (art. 26, parágrafo único, do CP).

Nesse sentido é a lição autorizada de Cezar Roberto Bitencourt (2008,
p. 360):
“A culpabilidade fica diminuída em razão da menor censura que se lhe pode fazer, em razão da maior dificuldade de valorar adequadamente o fato e posicionar-se de acordo com essa capacidade”.

Critica-se o termo semi-imputabilidade2, que soaria parecido com semivir­gem, semigrávida, pessoa semibranca ou semi-honesta, pois as pessoas nessas condições são dignas de um juízo de censurabilidade menor à vista da redução de sua capacidade de autocensura.

No caso dos fronteiriços ou semi-imputáveis, como sua culpabilidade está diminuída, em caso de condenação é obrigatória a redução da pena e, somente depois, numa segunda etapa, perquirir a necessidade ou não de aplicação de medida de segurança substitutiva (princípio vicariante).

Abordaremos com mais ênfase as questões referentes aos transtornos mentais na segunda parte deste livro, no campo da criminologia clínica.







1 Lições de direito penal: a nova parte geral, 10. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 203.

2 Apud Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de direito penal, 13. ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p. 360, v. 1.